quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho
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Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.

Continuamente me estranho.

Nunca me vi nem acabei.

De tanto ser, só tenho alma.

Quem tem alma não tem calma.

Quem vê é só o que vê,

Quem sente não é quem é,



Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.

Cada meu sonho ou desejo

É do que nasce e não meu.

Sou minha própria paisagem;

Assisto à minha passagem,

Diverso, móbil e só,

Não sei sentir-me onde estou.





Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.

O que segue não prevendo,

O que passou a esquecer.

Noto à margem do que li

O que julguei que senti.

Releio e digo :
"Fui eu ?"
Deus sabe,
porque o escreveu.



                                                         Fernando Pessoa

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